Uma outra estação


Que a tua luz, Senhor, Deus-Menino, esteja sobre mim e sobre os meus! A partilha do coração é uma forma livre de traduzir os sentimentos, a história pessoal, as alegrias, as lágrimas e as esperanças de uma vida, sobretudo o fruto da resiliência, das ressignificações dos acontecimentos existenciais. A partilha é também uma corajosa profecia.

Eu me recordo do dia em que, como postulante da vida missionária, me deparei com o primeiro constrangimento: deixar ir ao chão uma peça em vidro com fotos importantes dos pais fundadores. Uma pequena distração que gerou o irreversível. O que decorrera do fato gerou um outro tipo de constrangimento, aquele de que fala São Paulo: “o teu amor me constrange, Senhor”. Esperando a pena provinda das palavras ou do olhar, fui surpreendido pelo sorriso e o olhar nos olhos, acompanhado das palavras: “Filho, o céu vale mais que isso! Vamos adiante!”.

“O céu vale mais!” A afirmação seria ridícula se o contexto não se tratasse de homens de fé. Daí que a fé já não diz nada quando nos deixamos subjugar pelos acontecimentos. A fé pode dizer “tudo” quando não abrimos mão da concepção de que não há aprendizado sem o risco da tentativa pra ser feliz. Ser feliz é o meu desejo, o desejo de cada um que respira o sopro vital, o desejo de Deus para cada um dos seus filhos.

Ontem eu vivi um descaminho, amei e odiei, construí e destruí, esperei e perdoei. Descobri que há dimensões de inocência e há dimensões de culpa. Não sei o que é o arrependimento no outro, mas sei o que ele significa em mim, não como sentença de morte pessoal na autoacusação, mas na certeza de que a gente sobrevive não apenas para contar a história, mas para o recomeço, um novo nascimento. Quando isso acontece já não temos o direito de considerar o ontem uma tragédia, mas uma escola. Enquanto prosseguia pensava: “E eu suponho que isso é somente uma fase, ainda que eu não saiba onde esteja indo”.

A gente adquire ao longo do tempo uma das mais realistas das convicções: o coração é como um vulcão, quando desperta traz consigo uma beleza que encanta e uma lava que destrói. O ódio e o amor andam tão próximos. A história sacra nos relembra isso: dois ladrões, duas sentenças. O próprio amor pode “amar erroneamente”. Quando o amor sufoca, quando exige, quando não aceita o “não”, pode se transformar numa armadilha. Eu ainda acredito que o amor verdadeiro não mata, não destrói, não humilha, não senta a fumar seu cigarro de prazer e tomar seu drink em meio a gargalhadas pelo definhar do próximo.

Mas os reencontros traduzem muitos sentimentos, como os silêncios também. Na distância e no autocontrole se esconde uma força e uma direção. Olham-nos e pensam: o que lhe acontece na vida? Respondemos quase sem palavras: estamos ocupados com a continuidade da vida porque permanecer no erro é um suicídio lento, mas certo. Esta tal continuidade não pode ser apenas uma aparência de fortaleza e de busca de resultados e conquistas, como forma de acariciar o nosso ego que deve satisfação às nossas próprias loucuras e a quem nos cobra perfeição, conquistas, vitórias materialistas, não existenciais e geradoras de felicidade. Sabemos o que queremos, mas temos medo da opressão dos que podem nos dizer: és uma obra inacabada!

Depois de tudo, passados os dias, depois de compor a minha própria canção “o livro dos dias”, a serenidade está de volta e já contemplo algumas âncoras se desprendendo de suas seguranças. Âncoras que não quiseram apoiar o meu barco quando se encontrava sem rumo, mas que se desfazem por si só porque a aparência de fortaleza não sabe o que é a compaixão. O tempo é uma escola e a melodia dos dias atuais é mesmo de reconciliação, ou como aquela linda sonoridade que emana do “Sagrado Coração”, composta pelo poeta.

Não se precipite em julgar o que há sob o véu das palavras ou em suas entrelinhas. O coração tem a última palavra. Escolha o amor, sobretudo o amor que se desfaz das muitas promessas e dos desejos irracionais. Escolha o bem dos “redimidos”, a inocência das crianças, a juventude dos felizes.  Não há constrangimento no recomeço, mas em não querer aprender com quem realmente gosta de nós. Há gente que nos quer bem, que pensa em nós.  Há um coração que nos ama de verdade. Este é o novo de ontem, rejuvenescido na nova estação chamada hoje.

Marcos

Inteiramente livre perdoando...


Voltar a encontrar certas pessoas e olhar nos olhos como quem deseja comunicar apenas que o amor é mais forte que a morte e que o rancor nunca vale a pena, isto sim, é encontro que dignifica e plenifica a vida. Lembro do filme "A última das Guerras”, simplesmente emocionante... Sim, libertar-se da condição de sempre acumular o que é nocivo à felicidade é mais que importante, é vital. Ser livre, inteiramente livre perdoando.

Marcos

Cadência do amor...


O coração segue o curso do que entendo por vida. Vida verdadeira, não vida ilusória, muito menos seduzida pela falsa perfeição, mas inclusa naquela realidade existencial chamada vocação ao amor. E vocação é caminho, é procura e encontro, é fé e celebração, encontro e desencontro, lágrimas e risos... Vocação é construção interior dentro de uma cadência ordenada pelo amor e pela vontade de Deus. Vida e vocação num único instante, uma decisão, uma escolha, uma meta. Hoje é um dia feliz, apesar das infelicidades que se aninham nos contextos de muitas vidas. Hoje, exatamente hoje, no meu coração!

Marcos

Lembro do seu olhar... o amor


“Lembro das tardes que passamos juntos...", como diz a canção. Lembro de você com a saudade fruto daquela parte de mim que se foi contigo, e da tua parte que falta em mim, sem deixar de ser o todo que dá sentido à minha vida, o amor de Deus. Lembro do seu sorriso, sobretudo do seu olhar... Lembro de você e "não exijo" retorno, não dependo do reencontro para ser feliz e ser quem sou, mas confesso que sou amigo íntimo da esperança, porque desejo o reencontro, desejo te ver e te ter. O amor pede vínculos... o amor eleva, compromete. Na verdade, descubro que "és parte ainda do que me faz forte". O amor não exige, espera, conquista, atrai, gera simbiose e comunhão.

Marcos

Cada dia para mim é o mais importante...


Cada tempo de minha vida, cada dia, cada instante se faz de intensas procuras e insatisfações, ou, melhor dizendo, de inquietações salvíficas. Os dias de hoje já não são os de ontem, nem mesmo as pessoas com quem me relaciono hoje são, em sua totalidade, as mesmas de ontem. O tempo passa, as pessoas seguem o curso de suas procuras, escolhas e realizações... A vida dá prosseguimento fora e, principalmente, dentro de mim. O fato é que não tenho motivos para reclamar da vida ou culpabilizar contextos e os outros. Tenho, na verdade, que continuar a trabalhar minhas trevas sem me autosufocar por acusações. Idiotice se martirizar pela minha condição de criaturalidade. Importa que não venha eu a me acostumar com as trevas e me deixar subjugar pelas quedas.

Penso que nada disso é mais difícil do que a realidade desafiante da convivência. A alteridade é caminho de transformação e sentido, porque as relações humanas sadias qualificam a vida, enobrecem os atos, dignificam os sonhos e estimulam os ideais. A gente passa a desejar tudo aquilo de bom que existe nos outros. Porém, é verdade que o caminho para essa alteridade é um caminho pascal. Nos dias de ontem a minha vida se encontrava numa direção e me veio as mudanças radicais, o que não são fatos acidentais, mas "encontros e desencontros", "chegadas e partidas" do coração e das razões. É muito bom sentir a resistência do coração para não se deixar vencer pelas vicissitudes da vida, mas permitir sempre se vislumbrar com as novidades de um amor que está para além de nós mesmos e de nossas razões, escolhas, amores ou desamores.

Às vezes não temos a real noção do quanto nossa vida está ligada a outras vidas e o quanto esta nossa vida comunica valores e sentido que acabam sendo luz, descanso e abrigo. Uma vez provado do que realmente me fez e me faz feliz, já não posso negar esse amor. Não importa se as novas decisões contrariem os nossos desejos - ainda que essas decisões se apresentem como contextos incompreensíveis -, importa que aquele núcleo interior continue sendo a fonte do sentir, do mover, do querer, do doar e recomeçar, ou seja, falo do amor a Deus, a si mesmo e à vida. Falo da fé, da esperança e da consciência cristã que  me lança na responsabilidade de construir este mundo à medida em que o Bem, a Ética e a Justiça são valores irrenunciáveis na minha vida.

Confesso que corro atrás do que acredito, como “persigo os ideais que prego”, mas não quero jamais deixar de lembrar que cada dia para mim é o mais importante. A salvação é hoje, a vida é hoje, o recomeço é hoje, a continuidade desta felicidade palpável é hoje, não importa o ontem e o amanhã. E, claro, aprendo isto também dentro do mistério da alteridade. O outro é mesmo uma completude, uma presença e apoio que me ajuda a continuar. Aliás, vem do grande Outro, o Deus-Amor, o sentido de cada dia. Isto não é poesia, é fé. Por isso creio, desejo e decido viver! Deus me conceda a graça.

Marcos - 09 de agosto de 2012
Memória de Santa Edith Stein

Mais que poesia, a amizade é vocação


Eu acredito na amizade, na sua missão de ministério e na sua vocação de mistério que redime, que plenifica, que integra a pessoa àquele núcleo de relações refletidas pela comunhão da Trindade. Acredito na amizade humana, sobretudo quando percebo cada dia o quanto Deus se utiliza dos amigos verdadeiros para também realizar Sua obra de salvação em nós. Amigos transparentes, sinceros, corajosos, convictos e destemidos no exercício da vocação da amizade, por isso a palavra oportuna, a correção, a "reclamação", o chorar e o alegrar-se conosco... É bela a amizade humana, porque assim o amor da Trindade é belo. Mais que poesia, a amizade é vocação, é missão. Deus me ajude a ser amigo e a cultivar aqueles que são atos concretos do Seu amor na minha vida.

Marcos

Parece que as palavras voltaram...


Muitas vezes não consigo nada escrever, nem mesmo tentar traduzir o que se passa aqui dentro, pois faltam as palavras, as ideias não se juntam, o coração não consegue entrar em sintonia com a mente. Tudo parece ficar suspenso, tudo parece exigir apenas quietude. São processos de mutações necessárias, sobretudo quando vivemos um tempo em que os valores nos quais acreditamos são os primeiros a exigirem consonância de vida. Temos os nossos refúgios, tenho os meus também. As coisas parecem decifradas, mas apenas parecem. Eu descubro que a minha interação com a vida, com as ideias, com os fatos e as pessoas é o que conta como mais importante, afinal a gente não tem como descrever a experiência de uma arte ou de um lugar apenas imaginando. A vida pede participação, presença, compromisso, vínculos, simbioses... Aí, quando isto acontece, os dias mais desafiantes não parecem assustar porque estamos, mais que "juntos", na existência do outro. O amor e a amizade têm seus dias de silêncio, não de indiferença e de descompromisso do cultivo. Parece que as palavras voltaram, e voltaram provando a mim mesmo!

Ant. Marcos 

A gente vai aprendendo..., ou reaprendendo!


De fato, o meu formalismo muitas vezes engessa as ações, e os gestos carregados de sentido, cuidado, respeito, gentileza custam tão pouco e proporcionam tamanha alegria e satisfação nos outros. É a necessidade de reaprender os detalhes da convivência que fazem a diferença. Ainda tenho que superar o medo dos "maus amados", das pessoas mesquinhas, egoístas, visivelmente presas à inveja, à cobiça, subjugadas por uma baixa autoestima, escravas de suas sombras históricas, dadas à insatisfação de suas ausências e infelicidades. Mas, cá entre nós, ninguém pode deixar de viver e ser feliz pelo fato dos outros não desejarem viver de coração livre, dispostos a serem tragados pelo amor, pelo perdão, pela esperança. Meus formalismos, minhas sombras e medos, eles existem, mas minha vida é muito mais que isso. Minha vida é caminho e não às apalpadelas, muito menos na postura carrasca de me cobrar além do que posso dar. A gente vai aprendendo, ainda que tardio, que os detalhes fazem a diferença, que o amor é real, que a felicidade é muito mais do que velhos conceitos que temos impregnados em nós. A gente vai aprendendo..., ou reaprendendo!

Ant. Marcos

É bom estar de volta...


Sentar ao lado e estender as mãos, reaprender com a virtude dos crescidos, dos que provaram da vida e se tornaram escola de sabedoria, escola de gratuidade, de perdão, de reconstrução interior sem esquecer jamais que nunca se pode deixar de “ser para os outros”, sim, é exatamente isto que parece acontecer aqui dentro de mim. Olhar o ontem como parte do hoje, mas como ponte que leva a novos encontros e escolhas, não como paralisação em si mesmo. É bom estar de volta e é maravilhoso sentir as mutações no coração quando essas constituem parte de uma continuidade de um amor que vai além de meus mesquinhos sentimentos. É bom permanecer abrigado na tenda da fé, reencontrar cada dia a alegria deste prosseguir em Deus, e muito mais fascinado do que ontem, mais livre e mais feliz, porque “as bondades de Deus não terminaram, as suas ternuras não se esgotaram. Renovam-se cada manhã!” (Lm 3, 21-22). Sentar ao lado de alguém e reaprender que “só o amor e o perdão merecem revanche”, o resto precisa necessariamente passar, isto também acontece aqui dentro. Inclusive, passam-se os dias e o coração se encontra outra vez maravilhado pela certeza de que há uma novidade em cada detalhe de nossas boas escolhas, ainda que elas tenham sido refeitas no casulo da dor. É bom estar de volta, estender as mãos, reaprender... A virtude dos crescidos também se traduz pela virtude de vidas jovens, vidas que não compactuam com o que destrói a si e aos outros. É bom estar de volta, inclusive é bom reescrever essas linhas, olhar nos olhos daqueles a quem amamos de verdade, sentir que suas vidas alcançaram a nossa, principalmente quando a estrada parecia solitária. Vidas que continuamente comunicam esperança aos nossos cansaços. Sentar ao lado, estender as mãos, deixar-se amar, reaprender o amor doado, ser simplesmente feliz por “ser com o outro e para os outros”.

Ant. Marcos

A arte da convivência


"Arte mais bela é a arte da convivência, por isso é a mais difícil", teria registrado Mário Quintana. De fato, quem duvida deste "axioma"? Quem ousa dizer o contrário? Certamente nenhum de nós. Os amigos, os namorados e os casados conhecem a beleza e o desafio da arte da convivência. Os consagrados, os religiosos e presbíteros também conhecem os dois lados da moeda. Mesmo assim, escolher viver sem o calor da convivência é tornar a existência insuportável, sem sentido, sem uma razão fundamental que dá nobreza à vida, o fazer-se um com o próximo, seja ele quem for. Até mesmo os que nos perseguem ou aqueles com os quais sentimos ser mais difícil conviver, todos dependemos uns dos outros. Daí que o mundo clama compaixão, solidariedade, tolerância, paciência, perdão, porque a violência, a indiferença, a mentira e todo tipo de discórdia e egoísmo constituem morte da família, das relações, da convivência, da fraternidade. Estar ao lado em dias como os nossos não é nada fácil, é desafiante, mas é a mais bela de todas as artes. Estar com o outro, estar na vida do outro, viver para o outro, não obstante nossas carências e feridas, é mesmo uma arte do Criador, um desejo, um desígnio, uma realidade que precisa tornar-se concreta em nossas vidas.

Ant. Marcos

Minha Mãe, simplesmente gratidão!

Diante da oferta da maternidade, traduzida como fruto do amor de Deus, sujeita às suas imperfeições, mas doada com coragem, vivida na espera, na alegria do encontro com o fruto das próprias entranhas, fazendo-se expressão do cuidado, vivendo as pequenas mortes silenciosas para proteger, fazer crescer, formar, corrigir, testemunhando os movimentos tão concretos do coração diante da alegria, da tristeza, das lágrimas, celebrações, vitórias, desprendimento, da consciência de que tudo corresponde a uma vocação e missão, de ser colaboradora do Criador, de ser ponte para que a humanidade e a Criação permaneçam a caminho, absolutamente tudo isso exige de nós a sabedoria da gratidão. Obrigado, meu Deus, pela mãe que me deste, pelo contexto no qual tua vontade fez obra nova, não obstante as situações e circunstâncias, os limites..., simplesmente gratidão por ser minha mãe, o que já me impõe naturalmente uma dívida de amor. Conceda-lhe ainda muitos anos de vida e um dia a graça de viver a tua eternidade. Tudo o que o amor constrói permanece para sempre! Aos amigos e amigas um Feliz Dia das Mães! Nossa Senhora, Mãe de Jesus, Mãe de Deus, Mãe da Igreja, Mãe nossa, interceda sempre.

Ant. Marcos

Aquietar o coração, buscar a confissão e me recolher no silêncio interior...

"Jerusalém" está agitada, mas eu preciso aquietar o coração, buscar a confissão e me recolher no silêncio interior. Vai começar a celebração do Mistério dos mistérios. Dias e horas com fatos que se chocam com minha maneira de viver a oblação, com minha mesquinha forma de amar, de me dar aos outros. Fato e mistério que me desconcertam, mas que me atraem fascinado a este amor que não tem limite, que ama ao extremo de se aniquilar por mim. Fatos tão atuais, mistério tão palpável, quer no sentar à mesa com o Senhor, no reclinar da cabeça sobre o seu peito, quer no medo de segui-lo, na fuga e na traição quando assumi-Lo implica comprometer o que chamo de "meus planos". Amigo Jesus, amigo Jesus... Se eu te perder, se eu fugir outra vez, se seu te negar, conceda-me a graça de voltar sempre e leve-me aos pés da cruz, ajude-me a Te olhar e chorar o meu arrependimento. Esses dias serão "conflituosos", nos quais a fé será provada, o amor purificado. Porém, dias de Salvação. Sustente-me, Jesus, para que a Tua Páscoa não se torne dentro de mim simplesmente doutrina, verdades conhecidas apenas, mas Páscoa acreditada, vivida e celebrada. Páscoa testemunhada!

Ant. Marcos

"Memória feminina", memória de amor...

Costumamos falar da "memória feminina", ou seja, muito mais que uma sensibilidade ao simples ato do lembrar as coisas, pessoas e situações, mas aquela profunda conexão que elas, as mulheres, fazem entre coração e ação, corpo, mente e alma. Por isso, quando amam, nunca fazem em pedaços, mas por inteiras. Quando "se decepcionam com alguém", quando se sentem feridas, tudo é tão dolorido, porque tão interno, tão existencial, tão palpável... Na manifestação da dor ou da alegria, tudo é vivido com todo o ser, intensamente. Daí que quando usam a "memória feminina" para evidenciar o "óbvio", o que para elas já é esperado pelo coração, não estão procurando evidência, mas celebração do detalhe, do cuidado, do amor, da gentileza, do respeito, da fidelidade, da amizade, do amor partilhado e celebrado. Esta "memória feminina" tem mesmo a ver com a natureza de Deus, pelo menos na sua dimensão mais positiva: "O Senhor se lembra sempre da aliança!", reza o Salmista (104/105). Não sei exatamente o porquê desta relação que acabo de fazer, mas creio que Deus deseja que não esqueçamos que sua memória de amor vê o detalhe, por isso Ele cuida de nós na dor e na alegria, no ontem, no hoje e no amanhã. "Memória feminina", memória de amor, amor humano, amor divino, amor de salvação.

Ant. Marcos

Partilhas: Viagem existencial...

Outro dia um amigo querido me escreveu a seguinte frase: "Amigo, sempre filosofando ou quem sabe viajando no tempo...". De fato, faço os dois, "filosofo e viajo", mas o faço acrescido da fé. Não escrevo, pois, infelizmente não tenho este dom, não desenvolvi o talento e a arte da língua escrita, apenas "viajo" para dentro de mim e tento partilhar, traduzir os meus processos interiores. A surpresa é que a gente acaba se deparando com a "viagem" de outros corações. Não os vejo fora de si, alienados, desencarnados... Vejo vidas contextualizadas, vejo lágrimas e alegrias, mas vejo sobretudo o lapidar da esperança. Se "filosofo de verdade", isto me alegra porque a filosofia é inquietante, arranca-nos da sonolência do mesmismo interior e do que nos cerca. Aos poucos - como dizia o poeta Renato - vamos assimilando o que é Ética e o que é o Éter. Se filosofo, então penso como fazer isto na base da fé. Não quero simplesmente "entender", ou me mostrar sábio, mas o que quero mesmo é crer esperando. A fé é também uma viagem quando provoca partidas e chegadas, alegrias e crises. Ela faz um caminho de volta, de volta não ao ocaso da alma, mas ao nosso interior, à nossa própria consciência, ao nosso coração. Bem, desculpem-me minhas "viagens", minhas "filosofias". Apenas compreendo que uma partilha não é uma obra literária, mas uma das formas do coração viver a viagem da fé, "a viagem existencial". E a fé é um dom, e sua linguagem é a simplicidade.

Ant. Marcos 

...continuar em frente! Assim é a vida!

Muitas imagens com frases de motivação, superação, de promoção dos valores e virtudes circulam na internet, sobretudo nas redes sociais. Uma das muitas que já selecionei para o meu banco de dados foi esta de “Rocky Balboa” (filme), registrada praticamente como a última cena. A frase acrescentada na imagem diz o seguinte: “Nem você, nem ninguém baterá tão forte quanto a vida. Não importa quão forte você golpeia, mas sim, quantos golpes você aguenta levar e continuar em frente. Assim é a vida!”. A história emocionante de superação que o filme apresenta faz a gente, de fato, pensar e constatar que o mais importante é continuar em frente, apesar dos golpes que sofremos. Não são simplesmente “as pessoas que nos machucam”, mas a própria realidade de estarmos, como pessoas limitadas, convivendo também com o imperfeito, o limite, a fraqueza, o desamor, a frieza de mentes e corações. Mas, apesar disso, temos de ir adiante! E prosseguir não com ressentimentos e até ódios, mas alegres, gratos a Deus, abertos ao perdão, reconciliados com nossa história, corrigindo os erros, disponíveis às novidades de Deus, capazes de descobrir e valorizar as coisas boas na vida e no coração dos outros. É verdade, os socos nos deixam cambaleando, com a visão turva e até podemos ir ao chão, mas um homem e uma mulher de fé não se entregam, absolutamente nunca. Deus nos ordena: “Levanta, filho, filha! Continue em frente!” Gostei desta imagem e gostei da frase. Gostei da compreensão que tive dela. Ajude-me, Senhor, a ficar sempre de pé e conceda-me sua graça, sua alegria, sua amizade.

Ant. Marcos  

Amor provocador...

Um dia, mais um dia ou "um novo dia?" Sim, um novo, não porque seja o alvorecer, porque na verdade escrevo no seu definhar, nas suas horas avançadas, na sua hora de recolhimento. Um novo dia assim se fez por aquilo que, concretamente, determinou o começo de um novo tempo, a continuidade de uma obra de amor e reconstrução de Deus, a antecipação das suas surpresas e novidades. Obrigado, Senhor! Passos, decisões, compromissos, oferta, encontro, saída, reconstrução, alegria, chamado, envio... Teu Amor, meu querido paizinho, é tão provocador na minha vida, tão fascinante, tão desconcertante, tão vivo, tão real. De minha parte, gratidão!

Ant. Marcos 

Cabe nós dois...

"Coração não é tão simples quanto pensa, nele cabe o que não cabe na dispensa, cabe o meu amor, cabem três vidas inteiras, cabe uma penteadeira, cabe nós dois... ". Estava aqui lembrando esta canção da "Banda mais bonita da cidade"! Pois não é mesmo que no coração cabe tantas vidas, vidas a dois, vida de amigos, vida de sonhos, vida a seguir adiante, vida de recomeço, vida Trinitária, vida Ressuscitada.
Ant. Marcos

Esperar e confiar...

Eu sei que esperar não é fácil! A gente muitas vezes se sente perdido na dúvida, porque a espera exige um salto na confiança, e confiar é também um ato de cruz. Pelo menos é o que eu aprendo com Maria, especialmente na sexta-feira da Paixão. Mas também é certo que uma vez conquistados e provados, a confiança se torna em nós como uma semente em terra fértil: cresce e atinge o seu alvo. A confiança nasce muitas vezes da "luta com Deus", não para vencê-Lo, mas para não largá-Lo, como fez Jacó. Ainda que feridos, queremos que Deus nos revele o Seu plano, pois sem o conhecimento e experiência deste plano, não há como esperar. Então é esta a confiança que tranquiliza o coração, ainda que circunstâncias e pessoas, ainda que meu próprio coração se comporte como aqueles amigos de Jó que, em determinado momento, interpretaram tudo errado acerca dos desígnios divinos e deixaram o homem de Deus confuso, tentado ao desânimo. Confiar, esperar, acreditar, recomeçar, perder se preciso, e morrer também, sobretudo a nossa pressa, miopia e impaciência. Deus está comprometido com a minha felicidade. Ele é a minha felicidade, por isso está me conduzindo, no seu tempo, ao melhor para a minha vida. Eu creio, eu espero, eu desejo, eu confio, eu vou.

Ant. Marcos

Novo tempo no coração e nos passos para Deus...

Queridos irmãos e irmãs, leitores e leitoras de minhas páginas - espaços de fé, comunhão e evangelização -, finalmente fizemos as devidas mudanças no design do Blog principal e do “Linhas e Reticências”, as quais eram esperadas a certo tempo. Mudanças simples, cuidando de deixar o essencial e conservando ainda mais o verde suave da esperança, também comum a este Tempo Litúrgico da Igreja, através do qual vivemos o “extraordinário no ordinário”, a celebração dos mistérios da nossa Salvação. Mudanças necessárias como símbolo de um novo tempo no coração e nos passos para Deus. Novo tempo na vida da Igreja, como bem manifestou o Santo Padre com o anúncio do Ano da Fé em comemoração aos 50 anos da abertura do Concílio Vaticano II, o que veio a ser naquela ocasião e ainda hoje, ocasião de renovada esperança para todo o povo de Deus. Rezamos para que as mudanças do Blog sejam acolhidas em cada coração, na certeza de que este espaço, ainda que com seus limites, não teria razão de existir se não em função de colaborar na evangelização, “dando as devidas razões de um coração que crê” (cf. 1Pd 3,15). Da mesma forma se renova o desejo e o compromisso de que as partilhas voltem a ser mais freqüentes, o que sempre fizeram bem a muita gente. Fica para nós, no começo deste novo, no continuar deste novo tempo, as palavras da Oração conclusiva do celebrante após a Prece dos Fiéis na liturgia deste dia, memória do “doutor do amor divino”, São Francisco Sales: “Iluminai-nos, Senhor Deus, para que, inspirados por vós, vos sirvamos no amor aos irmãos e irmãs”. Rezo e peço a oração de todos aqueles e aquelas que, de alguma forma são edificados com estas linhas de fé, na esperança de que as simples partilhas sejam frutos de uma iluminação da graça de Deus e que tudo seja um serviço de amor a Deus na pessoa de cada um. Deus abençoe a você, leitor e leitora deste Blog. Conte com minhas orações. Que Nossa Senhora, Mãe da esperança, guarde-nos sempre!

Antonio Marcos
Memória de São Francisco de Sales, 24 de janeiro de 2012.  
 

Partir em missão...


“Eles deixaram seu pai Zebedeu na barca com os empregados, e partiram, seguindo Jesus” (Mc 1,20). Precisaríamos hoje de um colóquio com Simão e André, Tiago e João, sobre essas tais disposições. Perguntaríamos o segredo do encanto, da sedução e da coragem de tudo deixar para seguir a Jesus. Coragem esta que foi ancorada na fé, e que uma vez provada e até negada, soube se refazer e continuar o seguimento a Jesus. O velho deu lugar ao novo. O pequeno mar de seus planos deu lugar ao oceano da vontade de Deus. Mas é certo que estamos outra vez encantados com o nosso barco, com as nossas “tralhas”, ainda que muitas vezes se traduzam por coisas úteis, necessárias e até vitais. É certo que hoje muitas vezes nos falta a coragem do seguimento, do rompimento de laços que nos prendem a nós mesmos e aos nossos tão pequenos projetos. Porém, o Evangelho continua sedutor, Jesus continua a nos convencer de que não há amor mais pleno do que o seu. Nós continuamos, ainda que com nossos passos lentos, a seguir a Jesus, através dos passos da Igreja, junto com os irmãos. “Partir em missão” é, sobretudo, decisões corajosas para romper com tudo aquilo que ofusca a visão do coração e da alma, nos deixando como barco sem leme, à deriva. “Partir em missão” é também recomeçar no perdão, na confissão, nos propósitos, na generosidade, na sensibilidade aos que precisam de nós, na humildade e na alegria que vem da fé.

Ant. Marcos